Cinco dedos, cinco pincéis, cinco deuses.
Uma virgem.
A página esbranquiçada foi iluminada por Ártemis
e Zeus saiu do polegar penetrando Hera que se lhe oferecia seminua, no médio;
Ares gerou-se no ventre do anelar e sentiu o maior prazer em apreciar a dor do
parto.
Tranquilamente, o indicador deslizou num
traço só e Apolo iluminou a madrugada repleta de odores lascivos , embrulhados
no corpo de uma Afrodite que uivava, num dedo minúsculo, de prazer.
Os cinco pincéis lutavam, numa fúria
desordenada, lançando tintas multicolores, com a caneta que queria registar o
nascimento de um Olimpo indescritível.
A folha branca foi-se confrontando com uma
imensidão de letras mescladas nas cores e dando forma ao impulso dos dedos que
não paravam de bailar, saltar, entrelaçando-se como serpentes e os esboços iam
e vinham, ora com nuances prateadas ora cor de fogo, ora implorando um descanso
desmedido. A intriga destes pincéis que se metamorfoseavam em caneta alucinada na corrente da
escrita tornava-se inquietante para uns dedos que desvairados giravam em
rodopios de pontas, paragens inertes, corridas desenfreadas, murmúrios
sibilantes, desejos incontroláveis, voltas e mais voltas, riscos e mais riscos,
pausas e mais pausas, interlúdios carnais... partos sofridos, corpos
extenuados, almas perdidas na espuma do amanhã.
Os raios ténues de um sol tímido rasgaram a
cortina de algodão e penetraram nos meus olhos obrigando-os a abrir. Senti um
arrepio de cansaço e pulei da cama à procura dos meus dedos, dos meus pincéis,
da minha caneta e ...
O meu corpo não me obedecia, agitando-se
numa sensação de aperto descontrolado, agitando as almofadas, as cortinas, os papéis amontoados na
secretária. De repente um grito lancinante saiu das minhas entranhas e senti um alivio quando a encontrei.
Estava ali. Na parede. A um cantinho, do lado inferior direito: cinco dedos,
cinco pincéis, cinco deuses, uma virgem.
A alvura da folha estava repleta com uma
aurora polar.
Arménia Madail, Julho de 2015